Dino sugere que Lei da Anistia não se aplica à ocultação de cadáver

Dino sugere que Lei da Anistia não se aplica à ocultação de cadáver

Ministro Flávio Dino Reconhece Repercussão Geral sobre Anistia e Ocultação de Cadáver

Pedro Rafael Vilella – Agência Brasil:

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, destacou a importância constitucional e a repercussão geral sobre a possibilidade de reconhecimento da anistia no crime de ocultação de cadáver. Este crime é considerado permanente, pois continua acontecendo no presente, caso não seja devidamente esclarecido.

Contexto da Lei de Anistia

A Lei da Anistia, promulgada em 1979, extinguiu a punibilidade de crimes políticos e outros relacionados, ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Esse período abrange grande parte da ditadura militar no Brasil (1964-1985). A decisão foi anunciada neste domingo (15).

Quando um caso é julgado pelo STF com repercussão geral, a decisão torna-se obrigatória para todos os tribunais de instâncias inferiores em casos semelhantes.

Denúncia do Ministério Público Federal

O processo em questão refere-se a uma denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2015, contra os ex-militares Sebastião Curió Rodrigues de Moura, conhecido como Major Curió, e o tenente-coronel Lício Augusto Ribeiro Maciel. Ambos lideraram operações contra militantes de esquerda na Guerrilha do Araguaia durante os anos 1970, nos chamados ‘anos de chumbo’. A denúncia do MPF não foi aceita em primeira instância nem pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), levando ao Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) agora admitido pelo STF.

“O debate do presente recurso se limita a definir o alcance da Lei de Anistia em relação ao crime permanente de ocultação de cadáver. Destaco, de plano, não se tratar de proposta de revisão da decisão da ADPF 153, mas sim de fazer um distinguishing [distinção] em face de uma situação peculiar. No crime permanente, a ação se protrai [prolonga] no tempo. A aplicação da Lei de Anistia extingue a punibilidade de todos os atos praticados até a sua entrada em vigor. Ocorre que, como a ação se prolonga no tempo, existem atos posteriores à Lei da Anistia”, afirmou Dino em sua decisão.

Condenação pela Corte Interamericana de Direitos Humanos

Em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil pelo desaparecimento forçado de 70 pessoas ligadas à guerrilha. O tribunal determinou que o Brasil investigasse, processasse e punisse os agentes estatais envolvidos, além de localizar os restos mortais dos desaparecidos.

O relatório da Comissão Nacional da Verdade (CNV), publicado em 2014, revelou que o Major Curió coordenou um centro clandestino de tortura, conhecido como Casa Azul, em Marabá, no Pará, além de atuar clandestinamente no Tocantins. Sebastião Curió faleceu em 2022 e foi recebido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro em 2020.

Impacto Cultural e Social

Na fundamentação da decisão, Flávio Dino mencionou o filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles e estrelado por Fernanda Torres. O filme retrata a história do desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva durante a ditadura, cujo corpo jamais foi encontrado.

“No momento presente, o filme ‘Ainda Estou Aqui’ – derivado do livro de Marcelo Rubens Paiva e estrelado por Fernanda Torres (Eunice) – tem comovido milhões de brasileiros e estrangeiros. A história do desaparecimento de Rubens Paiva, cujo corpo jamais foi encontrado e sepultado, sublinha a dor imprescritível de milhares de pais, mães, irmãos, filhos, sobrinhos, netos, que nunca tiveram atendidos seus direitos quanto aos familiares desaparecidos. Nunca puderam velá-los e sepultá-los, apesar de buscas obstinadas como a de Zuzu Angel à procura do seu filho”, relatou Dino.

O STF informou que a decisão de Dino reconhece a repercussão geral da matéria, com o objetivo de formar jurisprudência na Corte sobre a aplicação da Lei de Anistia a crimes que continuam a se consumar até o presente, como a ocultação de cadáver. Agora, a repercussão geral será avaliada pelos demais ministros em sessão virtual do Plenário.

Fonte: https://iclnoticias.com.br/dino-lei-da-anistia-nao-ocultacao-de-cadaver/

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